História da Cannabis

header logo

Racismo e Proibição

No século 19, a ciência farmacêutica começou a evoluir rapidamente, e a **Cannabis** apresentou desafios para essa nova disciplina. Médicos enfrentavam dificuldades em prever os resultados terapêuticos, devido à falta de padronização das plantas e dos extratos. Era complexo determinar quais produtos eram adequados para cada condição e qual a dosagem correta. Problemas na conservação da planta e dos óleos também dificultavam a reprodução consistente dos resultados. Com o surgimento de medicamentos mais modernos, a popularidade do uso medicinal da Cannabis começou a declinar nas primeiras décadas do século 20. Entretanto, a proibição da planta não foi motivada por preocupações com a saúde, mas por uma perseguição a grupos marginalizados que a utilizavam em contextos sociais. Nos Estados Unidos, a maconha era frequentemente associada aos imigrantes mexicanos. Com a Revolução Mexicana em 1910, a aversão aos imigrantes aumentou entre os norte-americanos, e a maconha passou a ser alvo de filmes, livros e reportagens que a ligavam à violência, homicídios e loucura. Essa campanha, conhecida como 'Reefer Madness', foi impulsionada por um filme famoso na época que ajudou a espalhar o pânico moral em torno da droga. Em 1937, a maconha foi proibida nos Estados Unidos. No Brasil, a criminalização ocorreu ainda no século 19. Em outubro de 1830, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro aprovou a 'Lei do Pito do Pango', que estipulava três dias de prisão para 'escravos e outras pessoas' que fossem pegas fumando maconha. No século 20, o psiquiatra sergipano Rodrigues Dória publicou textos na imprensa e um livro que associavam o uso da planta à degeneração moral, solidificando uma visão negativa da Cannabis na sociedade brasileira. A maconha foi incluída pela primeira vez em convenções internacionais sobre drogas em 1924, durante um encontro da Liga das Nações precursora da ONU. No Brasil, a proibição em nível federal foi estabelecida em 1938, durante o governo de Getúlio Vargas, com a Lei de Fiscalização de Entorpecentes. Com leis que restringiam ou proibiam a prescrição da Cannabis, sob pena de prisão até para médicos, o uso medicinal da planta desapareceu na Europa e nas Américas. Em 1942, a Cannabis foi removida da farmacopeia americana.

O Renascimento da Cannabis Medicinal

O interesse pelo uso medicinal da Cannabis começou a ressurgir a partir das pesquisas do químico búlgaro-israelense Raphael Mechoulam, que foi o primeiro a isolar dois dos principais compostos ativos da planta. Em 1963, ele isolou o canabidiol (**CBD**), e no ano seguinte, o tetraidrocanabinol (**THC**), identificando este último como o composto responsável pelos efeitos psicoativos da planta. A partir daí, uma nova classe de substâncias foi definida: os canabinoides. Estudar como essas substâncias atuam no organismo humano permitiu à ciência descobrir o **sistema endocanabinoide**, um mecanismo de regulação neuronal presente em todos os vertebrados. A identificação desse sistema de comunicação entre neurônios, até então desconhecido, gerou uma nova onda de pesquisas sobre a Cannabis e seu potencial terapêutico. No final do século 20, produtos farmacêuticos contendo canabinoides isolados, como o Marinol e o Dronabinol, foram aprovados para o tratamento de náuseas e vômitos em pacientes com câncer, além de estimularem o apetite em pacientes com HIV e doenças terminais. O avanço das pesquisas também fortaleceu grupos de pacientes que passaram a lutar pelo direito de cultivar a planta e produzir seus próprios medicamentos. Em 1995, um plebiscito na Califórnia, EUA, aprovou a 'Lei da Compaixão', que criou a primeira regulamentação para o uso medicinal da Cannabis em décadas. Em 2001, a pressão de pacientes levou dois países, Canadá e Holanda, a criarem regulamentações específicas para a produção e uso medicinal da Cannabis. Uma nova onda de interesse global pela Cannabis ocorreu em 2013, quando o médico e celebridade americano Sanjay Gupta lançou um documentário destacando o valor terapêutico da planta e o uso do canabidiol para epilepsia refratária. Por não causar os efeitos psicoativos típicos da maconha, o uso do canabidiol passou a ser aceito em diversos países, mesmo em meio a persistentes estigmas morais associados à planta. No Brasil, essa mudança de percepção começou com a história de Anny Fischer, uma menina de Brasília que sofria de uma doença rara causadora de epilepsia refratária. Em 2014, ela se tornou a primeira paciente no país autorizada a usar Cannabis legalmente. O caso de Anny levou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) a permitir a importação de medicamentos à base de Cannabis. Em dezembro de 2019, a ANVISA autorizou a produção nacional e a venda de derivados de Cannabis em farmácias, embora o cultivo da planta ainda seja proibido. A história da Cannabis medicinal continua a ser escrita.
© 2024 Buscannabis. Todos os direitos reservados.