"Desconhecimento relacionado ao preconceito da classe médica em relação à Cannabis"
- Redação

Com base em sólidas evidências científicas e uma perspectiva entusiasta, a Associação Médica do Espírito Santo (AMES), por meio de seu Diretor Científico, Dr. Walter José Fagundes Pereira, defende a Cannabis medicinal como uma ferramenta terapêutica promissora.
"Apoiamos a questão medicinal da Cannabis. Na minha opinião, o preconceito dos médicos está na ignorância, no sentido de desconhecimento. Já que ninguém aprendeu na faculdade", pontua.
Segundo o profissional, a AMES observa a necessidade de maior conhecimento sobre o tema entre os profissionais de saúde, superando o preconceito decorrente da falta de informação e treinamento. Para isso, a entidade planeja oferecer um módulo pioneiro sobre terapia canabinoide em congresso que será realizado no final de outubro. O objetivo é que a prescrição informada, e responsável, de medicamentos à base de canabinoides seja ampliada.
Em entrevista exclusiva para o portal Cannabis & Saúde, Dr. Walter, que é neurocirurgião com especialização em medicina canabinoide, enfatizou que a capacitação médica é fundamental para que os profissionais possam prescrever esses medicamentos de forma informada e alcançar os resultados terapêuticos para seus pacientes.
Como a Associação Médica do Espírito Santo vê a aplicação da Cannabis medicinal?
"Primeiramente, é um prazer poder participar a respeito de um tema tão importante, tão interessante, e que tem feito diferença na vida de muitos pacientes. Estou na direção científica da Associação Médica do Espírito Santo, e sou médico, especializado com pós-graduação em medicina canabinoide. Me sinto muito à vontade para falar a respeito desse tema. Eu tenho trabalhado com isso há mais ou menos uns 6 anos com alguma experiência nesse tipo de tratamento."
Sou de formação neurocirurgião e especialista em dor. E, essa questão de medicina canabica não existe. Na verdade não existe. O que que existe são as medicações que utilizam os compostos da Cannabis. E que devem ser usados por todos os médicos.
Mas como é relativamente recente, os conhecimentos relacionados às substâncias, aos componentes, da Cannabis, a gente começou a entender um pouco mais, a respeito desses componentes e a respeito do próprio sistema endocannabinoide. Então, há essa nomenclatura de medicina canabinoide, mas, na minha opinião, na verdade não existe ou não deveria existir.
Não é uma questão do médico, mas é principalmente do médico, já que eu não vejo nenhum preconceito em relação à Cannabis na população. Não vejo nenhum preconceito. Nunca tive nenhum paciente que eu propusesse o início de medicações, com base na Cannabis e que ele falasse: "Não, não, eu não quero, eu não aceito, eu tenho preconceito".
Então o preconceito está na área médica mesmo?
Acredito que sim. Eu, na minha opinião, sim. E é mais uma questão de incluir esse tema nas escolas de medicina. Eu acho fundamental que o médico saiba do que se trata, porque o preconceito da classe médica está totalmente relacionado à ignorância, ao desconhecimento, em relação ao tema.
Tenho a impressão de que 95% dos médicos não sabe prescrever hoje uma medicação à base de canabinoides. Então, isso acaba gerando um preconceito. Então o que eu defendo é que essa medicação faça parte do arsenal terapêutico, que o médico saiba prescrever quando indicado nas situações que tem indicação.
Porque a gente sabe que tem sim evidências científicas em determinadas doenças, tem muito trabalho, muita pesquisa a respeito dessas medicações em diferentes sintomas e em diferentes doenças. E realmente funciona. Mas funciona para todo mundo, para todas as doenças? Não, não funciona para todo mundo e nem para todas as doenças.
É uma questão de estar no arsenal terapêutico e todos os médicos terem conhecimentos básicos a respeito e que os possibilitem de prescrever quando necessário.
E com toda essa bagagem do Dr. como neurocirurgiã infantil e adulto, tratamento do Parkinson, professor, pesquisador e também diretor científico da AMES. Como é que o Dr. vê a capacitação médica hoje? Como é que a AMES trabalha em prol da pesquisa sobre Cannabis medicinal?
Isso ainda está muito incipiente, a formação nessa área está muito mais relacionada a interesses pessoais de cada médico. Mas existe sim uma ideia na nossa associação, que é fazer, sim, workshops. Nossa ideia no próximo congresso é ter um módulo relacionado pela primeira a medicina canabinoide.
Será no final final de outubro, ainda estamos desenhando esse programa com convidados, etc. Mas essa é uma das nossas intenções, pois a Cannabis já é uma realidade. Não estamos falando de uma medicação que é experimental. O desconhecimento é muito grande. Fiz um workshop com quatro médicos recentemente para conversar a respeito desse tema e nenhum deles sabia que a medicação é vendida na farmácia também.
O conhecimento geral a respeito desse tema é ainda muito pequeno e é realmente muito importante que a a gente como, sou professor, e dentro da da Universidade Federal do Espírito Santo também é um projeto, é uma ideia ainda, de desenvolver disciplinas optativas no primeiro momento, desenvolver isso dentro da faculdade. Realmente é muito importante que esse conhecimento seja difundido.
No último relatório da Kaya Mind indica-se uma porcentagem de crescimento no Espírito Santo de 74% de prescritores. Então, existe essa crescente. E dentro da AMES, o Dr. vê uma busca maior dos médicos?
Sim, eu tenho visto sim um maior engajamento dos médicos e é interessante que são de diferentes especialidades. Neuropediatra, ortopedista, médicos anestesiologistas que tratam dor, psiquiatras, são poucos mais resistentes, mas inclusive psiquiatras.
Observo que esse movimento tem acontecido e acredito que vai acontecer cada vez mais. E quando a gente tiver isso engajado nessa questão educacional. Hoje a gente tem no Espírito Santo várias faculdades de medicina e até onde eu sei, nenhuma delas tem essa disciplina.
Além de diretor científico da AMES, eu sou também coordenador de um grupo de pesquisa internacional com 52 pesquisadores do mundo inteiro. Se chama International Group of Research in Neuroscience. Então são 52 pesquisadores de 13 países diferentes e a gente está trabalhando numa meta-análise agora que estuda a eficácia e a segurança da Cannabis medicinal na fibromialgia.
Estamos trabalhando agora na análise estatística. E o que tem apresentado esse esse estudo? Temos observado que realmente tem uma melhora importante na qualidade de vida, que está associado principalmente à redução da dor e melhora do sono. Então, esses são os resultados que a gente observou inicialmente.
Qual a relevância do sistema endocanabinoide para saúde?
É um sistema que até pouco tempo a gente não não conhecia, a nossa ideia era uma coisa mais binária de neurotransmissor excitatório, neurotransmissor reinibitório. Depois o professor Raphael Mechoulam lá em Israel mostrou que a coisa não é bem assim. E tem uma outra estrutura por trás que é o sistema endocanabinoide que faz uma modulação dessa atividade cerebral e que isso é muito importante para que a gente tenha uma uma homeostase.
E a partir disso aí, você abre um leque muito grande de possibilidade de tratamento com com as medicações à base dos canabinoides. Esse conhecimento é que é o substrato para que a gente possa fazer com que o médico entenda essa estrutura que a gente tem no nosso organismo e que ele compreenda melhor, então, o uso dessas medicações baseadas nos cannabinoides.
Sem dúvida nenhuma, o conhecimento do sistema endocannabinoide é fundamental para que a gente avance em relação aos médicos e quebre esse preconceito, se é que ele existe.
Dr., minha última pergunta é sobre a pesquisa e a relação da fibromialgia com a deficiência do sistema endocanabinoide. Esse estudo pioneiro vai ao encontro da teoria da deficiência do sistema endocanabinoide?
Recebi ontem, eu posso até colocar o áudio aqui da mãe de uma criança, não era com fibromialgia, mas uma criança com crise autista associado à crise convulsiva, epilepsia. A mãe mandou o áudio, foi um colega que encaminhou para mim. E aí atendi a criança e prescrevi CBD. Ontem a mãe mandou um áudio relatando que o menino agora está melhor na APAE, parou de dar crise, não fica gritando mais, está mais concentrado. São relatos, e isso não é placebo.
Mas voltando a questão da fibromialgia do sistema endocanabinoide, sem dúvida existe um desequilíbrio nesse sistema que faz com que essa dor, a gente chama de uma dor disfuncional, acabe alterando essa percepção cerebral em relação a dor. Pois de você for avaliar do ponto de vista estrutural, não existe uma lesão estrutural, o que existe é uma dor disfuncional.
E isso, obviamente, tem outras implicações, questões ansiosas, depressivas, distúrbios do sono e que acaba caracterizando a doença por si só. Então nesse modelo, neurofisiológico, a gente entende bem que as medicações à base de Cannabis têm um um bom resultado e é isso que a gente está querendo demonstrar com esse estudo.
Por fim, ficou claro que a Associação Médica do Espírito Santo (AMES), embora ainda em estágios iniciais de implementação, reconhece a necessidade de capacitação médica em relação ao uso de medicações à base de Cannabis. O movimento é impulsionado pela crescente evidência científica de sua eficácia em determinadas condições. Atualmente o Brasil conta com pelo menos 672 mil pacientes de Cannabis medicinal. E a entrevista com Dr. Walter deixou claro que as iniciativas da entidade buscam garantir que os médicos estejam aptos a prescrever a Cannabis quando clinicamente indicadas. Este é o único caminho seguro para pacientes: com o devido acompanhamento médico.
Importante: O acesso legal à Cannabis medicinal no Brasil é permitido mediante indicação e prescrição de um profissional de saúde habilitado. Caso você tenha interesse em iniciar um tratamento com canabinoides, consulte um profissional com experiência nessa abordagem terapêutica.
Fonte: Cannabis e Saúde.
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