Inuítes, Beduínos e o Sistema Endocanabinoide: A Engenharia Biológica da Sobrevivência Humana

  • Redação
Atualizado: 01 junho, 2025 14:32
<p>Po<strong>r Lauro Pontes</strong></p><p>&nbsp;</p><figure class="image image-style-side"><img alt="image.png" src="https://sechat-images.s3.amazonaws.com/image_427ac25988.png" srcset="https://sechat-images.s3.amazonaws.com/thumbnail_image_427ac25988.png 155w, https://sechat-images.s3.amazonaws.com/small_image_427ac25988.png 496w" sizes="100vw" width="496"><figcaption><span style="box-sizing:border-box;">Lauro Pontes é p</span>sicólogo clínico, pós-doutorando em neurociência.</figcaption></figure><p>A humanidade sempre desafiou os limites da natureza. Enquanto escrevo esta coluna, lembro-me das palavras do neurocientista António Damásio: "Somos máquinas vivas programadas para sobreviver". E que máquinas! Das geleiras do Ártico aos desertos escaldantes do Saara, populações como os Inuítes e os Beduínos não apenas sobrevivem, mas prosperam. O segredo? Uma combinação de engenhosidade cultural e uma rede biológica pouco celebrada: o sistema endocanabinoide (SEC).</p><p>&nbsp;</p><p><strong>O Ártico e os Genes que Esquentam Corpos (e a Ciência)</strong></p><p><br>Os Inuítes, habitantes ancestrais do Ártico, são um laboratório vivo de adaptação. Por séculos, cientistas debateram como suportavam dietas hiperlipídicas sem desenvolver doenças cardiovasculares. A resposta veio dos genes FADS, responsáveis pelo metabolismo de ácidos graxos. Estudos revelam que variantes genéticas nesses genes, presentes em 80% dos Inuítes, otimizam a conversão de ômega-3 em moléculas anti-inflamatórias. Mas há mais: o tecido adiposo marrom (BAT), uma "caldeira biológica", é ativado pelo gene TBX15, que regula a termogênese sem tremores.</p><p><br>Aqui, o SEC entra em cena. Pesquisas recentes mostram que a exposição ao frio reduz os níveis de anandamida (AEA), um endocanabinoide, no hipotálamo. Essa queda desencadeia a produção de calor no BAT via receptores CB1. Em outras palavras: o SEC age como um termostato evolutivo, ajustando nosso metabolismo às intempéries.</p><p>&nbsp;</p><p><strong>Beduínos: Os Alquimistas do Deserto</strong><br>&nbsp;</p><p>Enquanto os Inuítes dominam o frio, os Beduínos desafiam o calor. Suas cabras, aliadas na sobrevivência, revelam segredos fisiológicos. Em escassez alimentar, reduzem o metabolismo em 60% – não pelo intestino, mas pelo músculo esquelético. Nos humanos, o SEC modula essa economia energética. O 2-AG, outro endocanabinoide, suprime o apetite em condições extremas, priorizando a queima de reservas.<br>A hidratação é outra proeza. As cabras beduínas reidratam-se com 30% menos água que bovinos, graças a rins adaptados. Nos Beduínos, o SEC regula a excreção de sódio e a retenção hídrica via receptores CB2 nos túbulos renais. É a biologia confirmando a sabedoria ancestral: suas tendas negras, que canalizam brisas frescas, são extensões desse equilíbrio homeostático.</p><p>&nbsp;</p><p><strong>O Sistema Endocanabinoide: Um Legado Evolutivo</strong></p><p>&nbsp;</p><figure class="image"><img alt="ChatGPT Image 19 de mai. de 2025, 21_32_44.png" src="https://sechat-images.s3.amazonaws.com/Chat_GPT_Image_19_de_mai_de_2025_21_32_44_a297bea1f8.png" srcset="https://sechat-images.s3.amazonaws.com/thumbnail_Chat_GPT_Image_19_de_mai_de_2025_21_32_44_a297bea1f8.png 234w, https://sechat-images.s3.amazonaws.com/small_Chat_GPT_Image_19_de_mai_de_2025_21_32_44_a297bea1f8.png 500w, https://sechat-images.s3.amazonaws.com/medium_Chat_GPT_Image_19_de_mai_de_2025_21_32_44_a297bea1f8.png 750w, https://sechat-images.s3.amazonaws.com/large_Chat_GPT_Image_19_de_mai_de_2025_21_32_44_a297bea1f8.png 1000w" sizes="100vw" width="1000"><figcaption><strong>Imagem gerada por IA</strong></figcaption></figure><p><br>O SEC não é um mero coadjuvante. É herança de 600 milhões de anos, presente até em ouriços-do-mar. Nos humanos, orquestra desde a implantação do embrião até a resposta ao estresse. Ele é a ponte entre ambiente e genoma.</p><p><br>As variantes genéticas dos Inuítes nos FADS não apenas processam gordura – elas produzem precursores para endocanabinoides. O EPA e o DHA são precursores da eicosapentaenoil etanolamida (EPEA), um endocanabinoide anti-inflamatório. Ou seja: a seleção natural moldou não apenas o metabolismo, mas a sinalização canabinoide.</p><p><br>Em ambientes extremos, o estresse é crônico. O SEC modula o eixo HPA (hipotálamo-pituitária-adrenal): a AEA inibe a liberação de cortisol, enquanto o 2-AG a estimula. Essa dualidade permite ajustes precisos – vital para um Beduíno em uma tempestade de areia ou um Inuíte em uma caçada noturna.</p><p><br>Estudar essas populações não é mera curiosidade acadêmica. A história humana é escrita por genes, cultura e moléculas. O SEC, como demonstram Inuítes e Beduínos, é o fio condutor. Em um planeta em crise climática, entender essas adaptações não é opcional – é sobrevivência.</p><p><br>A cannabis, tão ancestral quanto nossa espécie, tem muito a ensinar. Resta-nos escutar.</p><p>&nbsp;</p><p>&nbsp;</p>
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